Nugu-ui ttal-do anin Haewon

A caminho de se encontrar com a mãe com quem combinou almoçar, Haewon, estudante de cinema e aspirante a actriz, cruza-se nas ruas de Seul com a actriz/cantora Jane Birkin e pede-lhe um autógrafo. Birkin diz-lhe que ela se parece muito com a filha, Charlotte Gainsbourg, o que muito lhe agrada. Esta é apenas uma das muitas excentricidades deste filme de Hong Sang-soo, conhecido por retratrar a natureza humana nas suas relações quotidianas, nos seus encontros de rua, à mesa, em lugares distantes, misturando no processo o sonho e a realidade. Em Nobody’s Daughter Haewon, a protagonista, Haewon, fica a saber que a mãe se prepara para ir viver no Canadá, o que a deixa num estado de angústia e solidão que a leva a contactar Sung-Joon, o professor com quem recentemente terminou uma relação mantida em segredo. O encontro só acrescenta à depressão e à dúvida; à vontade de ceder aos desejos e à vontade de fugir. Como sempre acontece nos filmes de Hong Sang-soo, também aqui as personagens se sentem inseguras dos seus desejos, sem que isso desencadeie qualquer catarse já que, no final, esses momentos parecem dissolver-se na sua própria insignificância.

Blind Detective

Blind Detective é o mais recente filme de Johnnie To, realizador de Hong Kong que já foi Herói Independente em 2008. Chong, interpretado por Andy Lau, o célebre cantor, actor e apresentador da televisão de Hong Kong, é um detective da polícia que após um incidente que o deixa cego passa a aceitar, sem grande entusiasmo, missões por conta própria. Tung (Sammi Cheng) é uma polícia novata e incompetente que espera melhorar as suas qualidades de detective juntando-se a Chong, a quem reconhece capacidades invulgares potenciadas pela falta de visão. Juntos vão tentar resolver o desaparecimento de muitos anos de uma amiga de infância de Tung; mas o que à partida parecia um treino bastante acessível torna-se numa verdadeira missão policial.

Educação Sentimental

Baseado no mito grego de Selene e Endimião, da lua que se apaixona por um mortal e o condena ao sono eterno, Educação Sentimental de Júlio Bressane (Herói Independente em 2011) resulta do encontro entre Áurea, uma professora solitária e profunda conhecedora da literatura e Áureo, um rapaz inculto que só conhece o desejo físico, em que é mais experiente. Ela sabe muito, fala e declama as coisas que leu; ele escuta e nem sempre a compreende. Pouco a pouco, ele parece assimilar as lições que lhe são ditadas pela apaixonada Áurea. Os dois não podiam ser mais distantes, mas apesar do improvável romance, ele deixa-se levar para o passado de que ela fala, quando lia e escrevia, quando a literatura existia e impunha um ritmo próprio, contrastando com o ritmo frenético do mundo exterior.

O umbra de nor

Num dia de verão, em Bucareste, um padre é chamado para rezar por uma mulher à beira da morte, mas com tanto calor, as coisas podem não correr bem em O Umbra de nor.

The Airstrip ‚ Aufbruch der Moderne, Teil III

Nesta terceira parte da série de filmes sobre arquitectura de Heinz Emigholz, o realizador questiona-se sobre o significado de, enquanto alemão de uma certa idade, dever a sua vida ao lançamento da bomba atómica sobre Hiroshima e Nagasaki que puseram fim à Segunda Guerra Mundial. No filme a narradora, a actriz Natja Brunckhorst (Christiane F.), explica que Emigholz tenta captar a realidade através da lente de um presente radical em que o tempo é concebido como o momento entre o lançar da bomba e a sua detonação. É esse tempo, que não é futuro porque a bomba ainda não explodiu, nem passado, pois que a acção é irreversível, que descreve o vazio. Um tempo ilustrado por imagens de edifícios, monumentos e espaços públicos à volta do mundo (Alemanha, Itália, França, Espanha, Argentina, Uruguai, México, Brasil, Estados Unidos, Ilhas Marianas e Japão) que revelam como os espaços são construídos fisicamente, não apenas com cimento e aço, mas por narrativas históricas e nacionalistas.

Thing

Um arquitecto fala da cidade que construiu; aos poucos percebe que a cidade é imaginária e que o relato é apenas uma tentativa de dar forma às suas ideias. A par do texto, vemos uma animação que parte do processo inverso: de uma tecnologia que digitaliza edifícios já construídos, captando deles a sua estrutura ‚ a sua alma – e criando imagens pulverizadas, com aspecto de esboços, mais próximas dos edifícios imaginados a que se refere o arquitecto neste Thing.

Tokyo

Há em Tokyo um som metálico recorrente que regressa uma e outra vez ao longo do filme; no meio o silêncio; as imagens em negativo e câmara lenta são de caras (máscaras?) e de corpos que interagem, não se sabe se com violência ou com desejo; neste filme a preto e branco é quase tudo cinzento.

Trissákia 3

Num edifício que persiste desde o século XIV, Trissakia 3 mostra-nos a passagem do tempo num outro ritmo, o do percurso do sol ao longo do dia, iluminando directa ou indirectamente o passado, indicando a direcção do futuro.

When I Stop Looking

When I Stop Looking força o olhar sobre os retratados, cada um com deformações faciais específicas e perturbadoras; a demora no ecrã permite-nos percebê-los para lá da aparência, nas suas expressões e afectos.

Abus de faiblesse

Abus de Faiblesse é uma adaptação cinematográfica que Catherine Breillat faz do seu próprio livro autobiográfico com o mesmo título. A história centra-se num episódio particular da vida da realizadora/autora, quando, depois de ter sofrido um derrame e se ver parcialmente paralisada, contrata um delinquente para ser protagonista de um dos seus filmes e entre os dois se estabelece uma relação de extorsão e masoquismo, que culminou na condenação de Christophe Rocancourt por abuso de vulnerabilidade. No filme, as personagens têm outros nomes e a realizadora, Maud, é interpretada por Isabelle Huppert que contracena com o Kool Shen (um rapper francês de ascendência portuguesa) que no filme interpreta o papel de Vilko Piran. Esta distância entre as personagens e as que os inspiraram faz com que o filme supere um mero do seu carácter autobiográfico para explorar as fraquezas humanas e os jogos de poder entre as pessoas, capazes de alimentar relações destrutivas de que se não pode ou quer escapar.

Coro dos Amantes

O Coro dos Amantes é composto por três canções que, a duas vozes, contam o mesmo acontecimento asfixiante sob duas perspectivas diferentes.

Assemblée générale

Uma reunião de condomínio com tudo para ser rápida acaba por contar com presenças inesperadas, dispostas a fazer valer as suas reivindicações. É este o ponto de partida para General Assembly, um filme hilariante de Luc Moullet.

Alentejo, Alentejo

De origem popular, o cante alentejano sobrevive graças aos grupos que o cultivam no Alentejo e na periferia de Lisboa, os quais recapitulam em ensaio o repertório conhecido de memória, quase sem registo escrito ou sonoro e com reduzidas alterações criativas. No Alentejo, dezenas de grupos amadores reúnem-se regularmente para ensaiar antigos cantos polifónicos e para improvisar cantos sobre o tempo presente. Nascido nas tabernas e nos campos, cantado por camponeses e por mineiros, o cante alentejano deixou os campos e atravessou as fronteiras da sua região. Nas últimas décadas, com a diáspora alentejana, apareceram novos grupos na periferia industrial de Lisboa e em diversos países de emigração, acentuando o cante como traço identitário dos alentejanos onde quer que estejam. Este filme é uma viagem pelo Portugal contemporâneo, através de um modo musical único e dos seus intérpretes.

Death Row II

Depois de, na edição passada, termos mostrado a primeira parte da série realizada por Werner Herzog sobre a pena de morte nos Estados Unidos, este ano apresentamos Death Row II, que, segundo o realizador, permite encerrar as investigações pendentes. Desta vez ficamos a conhecer mais quatro condenados à morte e os casos que os levaram a essa condição. Evitando o sensacionalismo que, em geral, caracteriza a apresentação destes crimes, Herzog não apenas entrevista os envolvidos em cada um dos crimes (detectives, familiares e família das vítimas, testemunhas e assassinos) mas estabelece com cada condenado uma empatia que advém dos traços de humanidade em cada um ‚ não é preciso gostarmos de alguém, e menos ainda do que a pessoa fez, para nos aproximarmos de uma pessoa; muitas vezes temos em comum histórias, gostos e lugares, e são essas pontes que humanizam o outro e fazem com que melhor se perceba que o horror maior é a pena de morte. Mais do que em qualquer outro dos seus filmes, nestas séries sobre a pena de morte, Herzog revela o que será talvez o seu maior dom: a capacidade de falar às pessoas com dignidade e responsabilidade, guiado por uma curiosidade genuína e um enorme respeito por quem tem diante da câmara.

Drinking Buddies

Admirador assumido de comédias românticas e desencantado com o modo como se tornaram cada vez mais estereotipadas, Joe Swanberg recupera o género e dá-lhe um novo fôlego. Kate e Luke trabalham juntos numa fábrica de cerveja artesanal em Chicago, onde passam os dias a beber e a namoriscar um com o outro. Apesar de fazerem um par perfeito, cada um deles tem uma relação amorosa que inibe uma maior aproximação entre os dois. A relação é posta à prova quando os casais se juntam numa viagem de fim-de-semana. Filmado numa verdadeira fábrica de cerveja artesanal (a Revolution Brewing) e com os actores a beber a sério durante as filmagens e a improvisar grande parte dos diálogos, é impressionante como o filme, apesar do que sugere o seu enredo, consegue atingir uma tão grande maturidade emocional.

Helen of T

Lewis Klahr, presença constante no festival nos últimos anos, regressa com Helen of T, o terceiro filme da série Sixty Six, onde ao som de uma composição de Elmer Bernstein, contempla o envelhecimento.

Jewels

Jewels leva-nos para um universo misterioso e sombrio de insectos em diapausa, ao mesmo tempo que uma narração hipnótica nos introduz na doutrina do magnetismo animal.

Joe

Esta adaptação do livro homónimo de Larry Brown marca o regresso de David Gordon Green ao estilo mais independente que marcou o início da sua carreira. Este filme mostra-nos Nicolas Cage num papel convincente ao lado do jovem actor Tye Sheridan, que com apenas 17 anos e três filmes estreados detém já um número invejável de prémios de representação. Joe é um ex-presidiário que trabalha como lenhador e emprega uma série de pessoas locais, satisfeitas com as suas qualidades enquanto patrão. Mas nem os fantasmas do passado largam Joe nem ele larga o álcool, onde se refugia para os dispersar. Um dia um jovem adolescente empenhado em livrar-se do contexto familiar adverso em que vive pede-lhe emprego e Joe aceita contratá-lo. Entre os dois cresce uma grande amizade e ao conformismo de Joe junta-se a vontade do jovem Gary de escapar às dificuldades de uma pequena cidade sulista, filmada num estilo documental com toques de acentuado lirismo. Mas não se esperem sentimentalismos, nada disso!