Foco Silvestre

Jonathan Vinel e Caroline Poggi em foco

Desde a sua estreia em 2014 com Tant qu’il nous reste des fusils à pompe (urso de ouro no Festival de Berlim desse ano) que a dupla de realizadores Jonathan Vinel e Caroline Poggi, nunca mais parou de filmar compulsivamente e tem sido aclamada, tanto pela crítica como pelo público. Desde este filme-chave que as suas referências/obsessões permanecem e vão-se desdobrando em narrativas mais inventivas e modernas. O fenómeno grupal, maioritariamente masculino, onde as mulheres aparecem como personagens fortes e salvadoras e os homens especialmente frágeis na sua brutalidade; os jogos de computador e a internet que servem como “molas” da história para a posicionar, reavivar ou apenas pausar; as paisagens bucólicas com violência latente criando um universo supra-real, ajudado por efeitos especiais, que fazem sentido e ajudam a criar distorções de uma realidade totalmente construída; a música composta por Vinel ou por outros amigos, alternada com compositores clássicos, dão o ambiente a todas as histórias e aparecem nas alturas mais inusitadas e, porque não, nas mais próprias?

É muito interessante verificar que em muito pouco tempo, a dupla reposiciona o tradicional cinema francês, numa postura contemporânea cuja evolução poderia ter sido a do cinema americano contemporâneo. Mas enquanto este deixa as “muletas” dos efeitos especiais e da violência para histórias de super-heróis, eles são usados como ferramentas da própria história no trabalho desta dupla. Assim, às vezes parece que vamos ouvir falar inglês e o francês surge majestático – atropela, baralha e confunde.

As curtas seguintes a Tant qu’il nous reste des fusils à pompe, tanto em dupla como individualmente, Chiens, Notre Heritage, Martin Pleure e After School Knife Fight, que fizeram um circuito brilhante de festivais de cinema e onde chamaram a atenção pela sua originalidade, irreverência, talento e contemporaneidade, são uma espécie de desdobramento de temas do início, sempre aprimorando, com produções cada vez mais complexas, dispendiosas e ousadas. O que só poderia levar à sua longa de estreia, Jessica Forever, que será um dos títulos da Competição Internacional do IndieLisboa 2019 e que deveria ter estreado no festival de Cannes, por ser uma das obras mais rele- vantes de 2018. Acabou por estrear no Festival de Toronto e depois Berlim (secção Panorama) e desde aí confirmou-se o que já se sabia. São os artistas do momento, os que produzem mais pensamento contemporâneo, os que compreendem os tempos que vivemos e o reproduzem em filmes impecavelmente bem realizados e produzidos. Há muito tempo que não se sentia uma tal força e irreverência no cinema francês, no cinema europeu e no cinema mundial. Esta dupla não é apenas um fenómeno de moda, é a nova definição do cinema, o que reflecte o seu tempo e o que irá buscar de novo espectadores para dentro da sala de cinema, do computador e da nossa cabeça. É nesse sentido que o IndieLisboa decidiu que o seu Foco Silvestre 2019 deveria ser sobre o seu trabalho. A retrospectiva é integral (filmes feitos em dupla e individualmente) e haverá uma gaming performance que será o momento mais alto deste foco. Uma vez mais, em jeito de originalidade, a carta branca proposta aos realizadores, que normalmente serve para designar um filme-influência, será aqui um espectáculo que entrecruza, jogos de computador, música e cinema. Onde é que isto já foi escrito?

Programa

A.B.
Jonathan Vinel, França, 2012, 4′

After School Knife Fight
Caroline Poggi, Jonathan Vinel, França, fic., 2017, 21′

Chiens/Dogs
Caroline Poggi, França, exp./fic., 2012, 24′

Jessica Forever
Caroline Poggi, Jonathan Vinel, França, fic., 2018, 97’

Martin pleure/Martin Cries
Jonathan Vinel, França, fic./anim., 2017, 16′

Notre amour est assez puissant
Jonathan Vinel, França, anim., 2014, 9′

Notre heritage/Our Legacy
Caroline Poggi, Jonathan Vinel, França, fic., 2015, 24′

Play
Jonathan Vinel, França, fic., 2011, 10′

Prince, puissance, souvenirs
Jonathan Vinel, França, fic., 2012, 10′

Tant qu’il nous reste des fusils à pompe/As Long as Shotguns Remain
Caroline Poggi, Jonathan Vinel, França, fic., 2014, 30′

Performance

Zone W/O People
Oklou & Krampf Live AV Project