“Jogámos com as fontes da vida e perdemos”: uma confissão de “Jules et Jim” (1962), de Truffaut, ao falar do tempo eufórico da juventude, dos primeiros grandes amores e das barreiras que eles quebraram, fazendo-nos crer que nada era maior do que o cumprimento dos nossos sonhos perante a força dos nossos sentimentos. Aqui, a euforia e as suas transgressões encontrariam, também, a realidade da vida adulta e a precariedade de um tempo que se tinha imaginado sem fim. Esse “Eden” são os 20 anos de uma época de ouro parisiense – a french touch dos anos 1990 e 2000, onde viveram os Daft Punk – em que um DJ vive preso ao ritmo constante que marca a vida, o amor e a sua noite.
Secção: Herói Independente
Nomeado para Melhor Argumento Original nos Óscares de 1991, a argúcia de “Metropolitan” – uma primeira obra a roçar a perfeição – viria a marcar o cinema dos EUA (“era aquilo que sonhávamos fazer”, disse Wes Anderson sobre o filme). Em Nova Iorque, um grupo de jovem adultos vive na bolha da alta burguesia para se distanciar, conscientemente, dos códigos da restante sociedade, promovendo serões de obsessivos jogos e conversas de sedução e sarcasmo. Um universo não tanto obcecado por si mesmo e as suas impecáveis aparências como pelas relações entre sexos e teorias sobre os sentimentos, pedindo para serem desfeitas por desejos inocentes e paixões inesperadas.
À sua habitual troupe de actores, Whit Stillman juntou Chloë Sevigny e Kate Beckinsale para um fascinante filme de época sobre uma paixão da sua vida: a música, ou mais especificamente, música que se dança. “The Last Days of Disco” não é apenas mais um retrato íntimo sobre quem definiu os costumes de uma geração – é uma ode ao desejo de se dançar ou ao desejo, simplesmente: mover os corpos, natural e desajeitadamente, para viver e seduzir quem nos observa, concretizando o caminho de interrogações, provocações ou de desejos escondidos na escrita do realizador. Start a love train.
A primeira longa de Mia Hansen-Løve é um berço para o que viria a surgir na sua obra: a ausência de quem amamos, a visceralidade de um amor que nasce e a temperança de saber vivê-lo. Aqui, o afastamento de um pai das pessoas com quem quis fundar a sua vida, antes do surgimento de uma filha que busca uma renovada possibilidade para viver a sua relação. E na passagem do tempo, uma união que a escrita ajuda a fazer viver, tanto nos seus reencontros como no tempo futuro (a memória) que dá eternidade aos seus sentimentos.
Se Camille (Lola Créton) chora sozinha a perda de um grande amor, será por nem todos entenderem como uma jovem de 15 anos sente ter perdido o amor da sua vida. Talvez não sintam, ao contrário dela e de outros que também amam, que nada determina mais as nossas acções do que os nossos sentimentos. O seu amor de juventude, assim, não é apenas feito de luz – são dias de escuridão que se percorrem até saber viver com a ausência e amar de novo. E descobrir, por fim, uma vocação e a sua derradeira relação com o mundo. O amor de juventude é, por isso, a história de um amor que nunca morre e que vive, enquanto respirarmos, por outras maneiras.
Guerín viaja para a cidade irlandesa de Innisfree, onde o seu estimado John Ford filmou O Homem Tranquilo, para explorar as mudanças desde a visita de Ford anos antes. Revisitando o passado, e recorrendo à representação de uma Maureen O’Hara imaginada, Innisfree explora as diferenças entre o antes e o agora de modo a traçar os interstícios entre a memória e a história, a imaginação, a fantasia e a realidade, e entre o cinema narrativo clássico e o documentário observacional contemporâneo.
No fim do seu “amor de juventude”, Mia Hansen-Løve recorre ao cinema para preencher um vazio. A sua porta de entrada surge, primeiro, pela interpretação, ganhando um papel neste filme de Olivier Assayas – não por acaso, sobre personagens entre estados de vida, relações, idades maduras e vontades jovens. Junto de actores emblemáticos do cinema francês, Hansen-Løve fomentaria o seu olhar para um trabalho futuro: a proximidade com actores e o seu desejo em filmá-los, vendo neles um espelho para entender e encerrar o mundo em que se vive.
Um jovem estrangeiro vagueia pelas ruas de uma cidade, observando e desenhando espontaneamente gestos e expressões. Procura uma mulher que aí conheceu seis anos antes. As memórias que tem dela e da imagem dela pairam sobre a cidade. Esta busca leva-o a outra mulher e a outra ainda, mas permanecerá para sempre sob o encanto daquela que está ausente.
A história de dois jovens mafiosos que devem muito dinheiro à máfia cigana. Filmadas sob os códigos dos filmes de acção, as lutas de rua e as perseguições ilegais de carro são meros pretextos para questionar um ambiente realmente perigoso, com uma incrível ramificação do crime organizado. Filmado de um modo próximo do documental, Rage dá a ver gangsters admiravelmente compostos por actores não profissionais.
A segunda longa de Mia Hansen-Løve retoma o tema da ausência, inspirada na vida do produtor Humbert Balsan. Se um pai é a sua principal figura, é também na sua ausência que deixa uma marca nos olhares de cada membro das suas famílias: aquela com que se casou e gerou novas infâncias, e aquela que fundou para dar filmes aos outros (a sua produtora). O sensível retrato dos temas graves da vida e dos seus sentimentos ganham delicadeza na subtileza do trato com que são filmados, unindo o tempo de um amor presente ao tempo da memória para se reencontrarem, por fim, nas casas onde vivem: a de uma família unida e dos filmes que outros realizaram.
Uma anónima cidade do futuro estilo rétro entra em pânico quando um diabólico chefe dos subterrâneos começa a raptar e devorar os recém-nascidos. Do ar surgem três super-heroínas: as melhores estrelas femininas dos anos 1990 de Hong Kong. Aligeirando um complexo enredo de traições e relações secretas, este barroco conto de galanteria nocturna oferece alguma da melhor acção ecstasy aerotransportada da época em Hong Kong, a idade de ouro da nova acção wuxia. Mas o filme transcende o seu apelo camp com complexas dinâmicas psico-sociais e sexuais: a ansiedade en drag da emasculação converte o poder maternal em super-heroísmo (Mui), anarquismo machão (Cheung) e desejo homossexual oculto (Yeoh). (S. Kraicer)
Ao longo de três anos, José Luis Guerín registou com um rigor obsessivo a demolição de uma zona do Barrio Chino, um bairro operário em desagregação em Barcelona, e a construção de um moderno complexo residencial para a nova classe média catalã. Mas à medida que a construção da cidade futura progride, o passado reafirma-se incessantemente: tanto na arrepiante descoberta do antigo cemitério romano debaixo das fundações do novo edifício como na riqueza da sabedoria popular revelada numa conversa casual entre dois velhos vizinhos.
Um velho famoso morreu e toda a gente se reúne no seu funeral. Ninguém parece muito afectado. À excepção do sobrinho do falecido, aparentemente a única pessoa incomodada, que assiste com horror à indiferença geral.
No porto mediterrânico de Barcelona, duas jovens desempregadas que vivem numa zona renovada, vagueiam pela cidade, desesperadamente à procura de emprego. Por fim, a sua própria casa está a ser destruída e elas tornam-se sem abrigo.
Antigo monge e actual stripper/culturista, Andy Lau tem a capacidade de ver o karma de uma pessoa, o destino adquirido ao longo da vida por feitos em incarnações passadas. As suas tentativas para proteger a jovem polícia Cheng da sua terrível predestinação através de uma série de acções visualmente exultantes fracassam. O filme começa como uma resplandecente fantasia de acção (um contorcionista indiano, uma Mosca Humana), passa a thriller semi-romântico e transforma-se finalmente num tratado filosófico Budista de estrutura complexa e profundamente original. Esta inesperada reviravolta Budista lança o mundo do filme para além da típica tragédia de To, numa nova e misteriosa dimensão. (S. Kraicer)
Os habitantes de uma aldeia de fronteira fazem todos negócio com os vizinhos do lado de lá. A mulher de um carteiro gordo e tímido fala com ele para o convencer a fazer o mesmo.
Numa bela manhã de Primavera, numa pequena aldeia que aguarda a chegada da Internet e onde a mulher do presidente da câmara anseia por um novo WC, o professor e o motorista do presidente da câmara dão por si juntos numa viagem até à cidade mais próxima. Encontrarão uma série de obstáculos ao longo da sua missão.
Dois trabalhadores dos caminhos de ferro vivem numa guarita de guarda-linhas. Não há muito que fazer e os dias são praticamente idênticos. Uma noite, um forasteiro tem um acidente. Um incidente que mudará para sempre as suas vidas.