O tempo não parou no estranho ateliê do Sr. Acácio Pina Coelho.
Secção: Competição Nacional
Bobô é um filme cuja narrativa parte do encontro de duas mulheres, Sofia e Mariama. O motor do filme é a sinergia criada entre ambas na defesa de uma criança. Sofia, a protagonista do filme, é uma personagem que vive presa nas sombras da sua infância, no peso da sua herança”, das quais é urgente libertar-se. Mariama aparece como um alguém ligado também à sua “herança”. Ela segue as regras que a sua pertença exige, mas num determinado momento vê-se obrigada a desobedecer para mudar o destino da pequena Bobô e evitar que esta seja submetida à mutilação genital feminina (MGF). As personagens Sofia e Mariama foram redesenhadas com as atrizes Paula Garcia e Aissatu Indjai (estreante neste filme), que muito puseram das suas vivências, personalidade e convicções. Fizemos um trabalho de investigação, de leituras, trabalho no terreno junto da comunidade emigrante guineense, de ensaios. Esta preparação permitiu-nos uma rodagem segura e por isso com espaço para o improviso. Penso que Bobô é um filme com uma óptica e lógica interna sem dúvida feminina, mas aqui o feminino não está, como tantas vezes é retratado, no campo do que é terreno e tangível. Está sim perante as questões que nos transcendem: a relação com a morte, com as regras do Mundo, com o que não conseguimos denominar. (Inês Oliveira)
Se o Lacrau visse e a víbora ouvisse não havia quem escapulisse. A víbora é surda e o lacrau não vê, assim é e assim será, tal como o campo é calmo e a cidade agitada e o ser humano impossível de satisfazer. Lacrau procura o regresso “à curva onde o homem se perdeu” numa viagem que parte da cidade em direcção à natureza. A fuga do caos e do vazio emocional a que chamamos progresso; matéria sem espírito, sem vontade. A procura das sensações e relações mais antigas dos seres humanos. O espanto, o medo do desconhecido, a perda dos confortos básicos, a solidão, o encontro com o outro, o outro animal, o outro vegetal. Um mergulho à procura de uma conexão com o mundo. Onde partida e chegada são a mesma, mas eu não.
Por vezes debaixo do nariz de um Homem estão coisas que só o próprio Homem não vê. Um cágado que não sai do mesmo sítio revela a teimosia de um homem que vai até ao outro lado do mundo para o encontrar. Uma animação com cor e diferentes escalas, baseada num conto de Almada Negreiros. (Carlos Ramos)
Havia, no distante Paraguai, um homem jovem… que tinha no coração um prado vazio. Este é o mote para um filme musical em animação, onde a realizadora joga de forma exemplar com biombos, canhões e dinheiro, entre a narrativa e a abstracção. Chagall, Picasso e Kandinski andam por aqui numa síntese que parecia impossível, num filme adaptado de uma obra de P. Cachapa. (Miguel Valverde)
A atribulada fuga de um jovem africano da sua terra natal. A procura de um mundo melhor, onde a guerra não faça parte do dia-a-dia. Mesmo quando a vontade de um só homem é inabalável, aquilo que o rodeia pode pregar-lhe uma partida. Uma animação que nos deixa sem fôlego enquanto acompanhamos esta viagem amarga. (Carlos Ramos)
António, Zé Maria e João vivem na Casa à medida que a constroem. Durante dois anos eles reiniciaram processos vezes e vezes sem conta, de acordo com as suas funções na Casa. As transformações de cada divisão obrigam a constantes mudanças na sua organização. As salas para refeições, para vestir ou descontrair mudam, assim como os seus habitantes. O tempo passa. Os moradores entram e saem de cena. A câmara não os segue, permanece, focada no particular. A luz natural invade os espaços geométricos, intensificando-se à medida que o trabalho avança. O som ambiente também muda. Os silêncios predominam. Os contrastes são cada vez mais fortes. No final, vemos os homens que fazem o filme para alguns, o trabalho para outros, ou simplesmente uma casa.
David & Golias
De uma circunstância ou curiosidade começou a minha pesquisa. Um processo ou um estudo para encontrar a intangibilidade de um objecto que está sempre em movimento, que nunca se detém, em nenhuma vida, em nenhuma época. Não podemos falar sobre ele, apenas sobre o que ele faz. Sobre os seus efeitos (…). (Leonor Noivo)
Assombradas pelas suas próprias vidas sem rumo, duas raparigas pré-adolescentes reencontram-se quando estão de visita à avó doente. No meio das suas fantasias com um passado medieval ‚ consumido pelo medo e pelo desejo ‚ as duas raparigas sofrem uma transformação e enfrentam um legado de opressão. “O amor é, finalmente, um cruzamento de pernas, uma união de barrigas, um breve tremor de artérias, uma confusão de bocas, uma batalha de veias, um enrolar de coxas, quem disser o contrário é uma besta.” Gregório de Mattos (séc. XVII) (Gabriel Abrantes, Daniel Schmidt)
“Exótica” resulta de uma residência artística em Maputo (Moçambique) em Março de 2008. Além de explorar os elementos da cultura local e o seu impacto nos ritmos e rotinas quotidianas da cidade, toca em questões como o movimento e a inscrição do corpo nos espaços urbanos.
Um jovem coreano caminha pelas ruas de Busan, cheio de raiva e de vontade de matar. O seu discurso interior de ódio interminável parece dirigir-se a cada pessoa com quem se cruza nas ruas ou no metro. No entanto, uma vez que é constantemente confrontado com o seu próprio reflexo, começamos a duvidar do limite entre o ódio e o auto-ódio, entre a realidade e uma distorção fóbica de personalidade. (Karim Shimsal)
Amadeu não só foi um grande pintor, mas um artista total. Apanhado na ratoeira do país onde nasceu, pelo tempo de destruição em que viveu e por si mesmo, teve uma vida curta e não lhe foi consentido o reconhecimento internacional que poucos artistas portugueses podiam ter tido.
Paula vive entre a educação da sua filha Beatriz, que lhe dá uma força vital para enfrentar os dias, e uma herança indesejada: cuidar da mãe Carminda, uma mulher demente e imprevisível. É Verão e está abafado. Paula já não é uma filha, mas sim uma mãe a tempo inteiro. Ela veste-se, come, toma banho, limpa-se e arranja-se. Contudo, numa manhã de imprevisto, algures e sem motivo aparente para além da exaustão, a fenda abre. Explode. (Cláudia Varejão)
Uma banda de heavy metal toca num palco meio perdido na escuridão e o som poderoso da guitarra atravessa uma cortina de fumo. Mas a noite tem muitos palcos e quando o concerto acaba, um dos elementos regressa a casa sozinho, em silêncio. À sua espera está um apartamento quase vazio e uma avó a precisar de companhia. (Ágata Pinho)
Quando descobre que a mãe morreu, um homem que tinha partido para França em busca de uma vida melhor regressa a Portugal. Seguimos as suas deambulações, os lugares que esqueceu. Sentimos o quão estranho se tornou aos olhos das outras pessoas. Há muito fora, ele não sabia que iria perder tudo e faz o luto à sua maneira. (Karim Shimsal)
Filme de citações artísticas corrompe o sistema mal comportando-se. O cineasta parte da premissa de Bresson de que um filme se deve construir sobre o branco e muda-a para amarelo. Assistimos à preparação de um filme, passando por todas as etapas até à sala de exibição. Com este filme, Godinho afirma-se no panorama nacional. (Miguel Valverde)
Num lago rodeado de edifícios, um homem constroi um barco. O sonho de uma viagem impossível, na livre procura das memórias de um passado eterno. Uma reflexão sobre o efeito da metamorfose do tempo e do espaço na vida de um homem e na sua feliz morte.