Enquanto as bombas caíam em Ghouta, um subúrbio de Damasco, os civis escondiam-se nas suas caves até que o inferno acalmasse. Tim Alsiofi era um deles e procurava, com a ajuda da sua câmara e da poesia, uma forma de expressão e de sobrevivência.
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Douma é uma cidade na Síria, perto de Damasco, que muitas vezes vemos nas notícias devido aos frequentes bombardeamentos. Mais do que o estrondo das bombas, o que estremece neste filme é o nosso interior. Vemos a banalização dos bombardeamentos para as pessoas que vivem em Douma. A forma como é normal para eles aquele dia a dia, o que fazem nos tempos de espera entre dois ataques e a forma como encaram e relativizam toda a situação. Filmado na primeira pessoa este filme afasta-se da reportagem de guerra. Aqui tudo é mais crú, mais à flor da pele, mais urgente. (Carlos Ramos)
Quão perfeita pode ser uma viagem num carro mágico pelas maravilhas do Estado da Florida? Ironia ácida, guiada pelos confins da memória de juventude de Chernyak, na qual a candura Disney faz conchinha com séries vintage como Benji ou Flipper.
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Um possível tesouro enterrado num sótão fictício, entre outras cassetes de vídeo, que não celebra senão o poder do cinema nos transportar, com um sorriso sarcástico nos lábios. Parte diversão Disney, parte homenagem musical ao estado americano, a realidade neurótica da vida adulta dá as mãos (e oferece um sumo de laranja) ao mais cego otimismo. Para umas férias, ou uma licença sabática, a vida simples vive-se na Flórida. (Ana Cabral Martins)
Pela janela de um comboio, Petronin impressionou uma tira de película numa câmara sem obturador, expondo-a um fluxo contínuo e sequencial de luz. O resultado é a dissolução do espaço entre frames e os elementos de uma paisagem a perder a sua solidez.
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Cinco minutos criados a partir da manipulação de uma fotografia de 35mm, tirada durante uma viagem de comboio entre Dordrecht e Roterdão, sem a ajuda do shutter. A fotografia ganha assim o movimento do cinema, absorvendo o fluxo de luz. Torna-se corrente e contínua. Formas perdem a definição; existem entre a figuração e a abstração. Cinco minutos que colapsam as fronteiras entre o cinema, a fotografia e a pintura. (Ana Cabral Martins)
Num estilo delicado, Moeschler ensaia o regresso de um jovem do campo à sua cidade de origem. O êxtase do reencontro, a possibilidade de recomeço, a amizade e o amor, as ruas nocturnas vazias.
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Num subúrbio francês, onde se pinta um retrato coral da juventude agrilhoada pela economia (há referências aos coletes amarelos, aos entregadores precários, às redes sociais), um rapaz decidiu ser pastor, longe dos mercados e das tecnologias da comunicação. Descreve-se o seu retorno, a um lugar, a uma comunidade a e a uma relação que fora deixada suspensa. A figura do reencontro constitui, portanto, o núcleo de “Abissu”: uma fábula sobre o voltar a olhar, a tocar, a sentir e a beijar um corpo amado. Um “West Side Story” ainda mais cheio de tesão. (Ricardo Vieira Lisboa)
Nesta animação de final de curso de Erik Svetoft, os animais estão presos num zoo e servem de entretenimento e humilhação. Cá fora as cores fortes anunciam a destruição da natureza. Um filme de dança e libertação.
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Não fosse este filme ter sido feito antes do confinamento, poder-se-ia especular que era o resultado de muito dias fechado em casa e sob influência de substâncias estranhas. Algen é um filme frenético e divertido, tão bizarro quanto inventivo. Dois animais fogem de uma espécie de jardim zoológico, depois de humilhados pelos visitantes, em busca da liberdade. Dois animais que gostam de dançar. (Carlos Ramos)
A busca mais velha do mundo, pela felicidade e pelo conhecimento. Nesta animação cuja estética evoca os primeiros videojogos, seguimos as aventuras de um pequeno homem de pixéis que procura um consolo espiritual junto de um sábio leão.
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Num mundo que parece um videojogo de outros tempos um rapaz acorda e não se sente feliz. Não sabe porquê nem o que deve fazer para ser feliz. Parte numa aventura com o seu cão muito semelhante à viagem da Dorothy no The Wizard of Oz e encontra animais antropomórficos no caminho até ao Sábio Leão. Num universo sem regras distintas o rapaz procura uma resposta à mais universal das perguntas para a qual ninguém tem uma solução. (Rui Mendes)
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A vida do ativista e professor queniano Rok Ajulu foi um filme de aventuras e de luta contra o apartheid. A sua filha presta-lhe homenagem usando a película 16mm, o VHS, o DV para filmar muitos dos locais que fizeram do pai um herói pela liberdade.
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Há conversas essenciais cujo sentido se vai revelando na passagem do tempo. Relatos, gargalhadas e silêncios recuperam uma relação que a vida descontinuou. Neste encontro em Kisumu, a filha descobre a ligação entre o pai, com quem nunca teve uma relação próxima, e o activista político que determinou o afastamento entre os dois. Neste filme a história de África e a da família fundem-se testemunhando que o que separa pai e filha não anula a cumplicidade do diálogo. (Margarida Moz)
O coletivo artístico Bambitchell explora, na linha do facto, da ficção e do ensaio, um conjunto de julgamentos na idade medieval que colocava no banco dos réus vários animais, mas também objetos inanimados, por crimes como o trespasse, roubo ou morte.
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O assunto é jurídico e a abordagem é igualmente metódica e isenta. A dupla Bambitchell propõe uma historiografia lúdica dos julgamentos de animais, pragas e objetos. Só que a sua mise en scène fundada no distanciamento irónico expõe as contradições da personificação dos direitos e deveres de criaturas. À medida que se evidencia o ridículo das sentenças, o filme desfaz-se em soluções inesperadas: a montagem, os grafismos, as composições ovóides, a banda-sonora musical e as invocações demoníacas refletem sobre as falhas inerente às ciências do direito. (Ricardo Vieira Lisboa)
Em “Os Últimos Românticos”, dois jovens homens confrontam diferentes pontos de vista sobre um mesmo acontecimento: um encontro sexual numa sala de cinema.