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Uma animação melancólica e divertida sobre um cientista com problemas de fé. As indecisões do personagem transformam-se numa hipótese para refletir sobre algumas das questões mais urgentes da nossa sociedade, desde as alterações climáticas à ideologia de género. O jogo torna-se interessante quando as respostas às questões que o filme coloca ficam muitas vezes a cargo do espectador. (Duarte Coimbra)
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O IndieMusic permite estas descobertas. Beatriz Ferreyra, compositora argentina e caçadora de sons, pioneira da música concreta nos anos 50 e 60, tal como Pierre Schaeffer, com quem colaborou. Neste pequeno e maravilhoso documentário entramos no mundo de Beatriz, nas suas ideias e pensamentos sobre o som, explicados com acções práticas de portas a ranger e cães a ladrar. Aura Satz filma tudo muito perto dela, a mostrar o seu corpo, os movimentos, as mãos, passando para o filme a materialidade das portas, dos barulhos e dos sons. (Carlos Ramos)
Baamum Nafi é um conto familiar centrado em Tierno, imã de uma aldeia senegalesa, e a sua filha Nafi. Nenhum dos dois está interessado em seguir cegamente os desejos do irmão de Tierno, líder islâmico que força a sua autoridade na aldeia, nem de sucumbir a extremismos religiosos. Prosseguir com um casamento-contrato entre os filhos dos dois irmãos e abraçar uma viragem no sentido de uma liderança hiper conservadora seria uma tragédia para todos os habitantes. Uma primeira obra pulsante pelas interpretações de Alassane Sy e Aïcha Talla, Baamum Nafi é uma lição de cinema e só podemos aguardar ansiosos o próximo filme de Mamadou Dia. Embora as obras de Dia e Ousmane Sembène (cuja obra integral mostramos este ano em retrospectiva) estejam separadas por décadas, o que os move, no coração do Senegal, continua lá: um cinema do Bem e do Mal, de estrondosa beleza. (Mafalda Melo)
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O belíssimo e inspirado regresso de Flávio Gonçalves atrás da câmara faz-se na continuidade nocturna e no (des)encontro dos corpos masculinos. Paulo envia para casa o último cliente do bar e encontra-se com o rapaz do olhar intenso. A procura prolonga-se e as luzes da noite de Lisboa não lhe falham. Será desta que o amor, o prazer e a quietude se alinham? Uma curta metragem em múltiplas rondas, de resultado vencedor. (Ana David)
Um dos raros casos em que o título do filme é a própria sinopse. Assistimos como que a uma experiência sociológica em que um ex-membro de uma seita, que viveu isolado do mundo, ouve pela primeira vez música. E o poder da música é enorme e imprevisível. Borgli constrói uma comédia inteligente e ousada, de consequências trágicas, que é também uma sátira à sociedade norte americana. (Carlos Ramos)
It’s Saturday afternoon in a Norwegian play-land. Children play uninhibited while an adult couple watches and eavesdrops on a conversation between three women about the existence of bacon on chips. That same couple decides to meddle in the conversation where they are not wanted instead of resolving their own issues. In great Noewegian humor awkwardness ensues while we sink lower in our chairs until it’s over. (Rui Mendes)
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O cinema como uma experiência de transe. Um transe o mais próximo possível da matéria do cinema quanto possível. No seguimento de “A Radical Film” (2017), Stefano Canapa experimenta novamente com rabanete preto em película não exposta para fabricar uma sinfonia sónica e visual de intensidade galvanizante. Enquanto o filme explode nas nossas caras a preto e branco e violentamente metamorfoseia padrões indomáveis em outros, perguntamo-nos para que espécie de corpo cósmico estamos a ser sugados, se uma superfície lunar se um buraco negro. Ou será a tela do cinema? (Ana David)
Genius loci é um termo do latim que se refere ao espírito de um lugar. Reine é a personagem principal do filme que se pode dizer que vive uma experiência espiritual da cidade durante uma noite. Um filme sobre a procura. Reine procura algo, mas não sabe bem o quê. Uma noite à deriva, com os sentidos aumentados. Uma animação tremendamente delicada, com diferentes técnicas e texturas e com o universo visual reconhecível do ilustrador Brecht Evens (A Fantástica Viagem de Marona). Adrien Merigeau passa, com esta animação a outro, nível. (Carlos Ramos)
Uma luz de final de tarde inunda uma sala de uma casa velha. O crepúsculo é indiciador de mudança, de algo que pode não estar bem. E é nesta atmosfera instável que o belga Bas Devos apresenta a sua personagem. Uma mulher árabe que não consegue voltar para casa ao final de um dia de trabalho. Imediatamente os nossos sentidos ficam alerta porque algo vai correr mal. São esses pensamentos que nos assaltam que fazem parte da narrativa mas não estão escritos ou filmados. Juntos com o filme, permitem estabelecer novos códigos e é aqui que a originalidade toma conta deste filme. O espectador atento e activo está no filme, do lado da personagem principal, com as suas dores e doenças, enfim, com a sua vida. É por isso que é tão bonito voltar àquela primeira sala e voltar a sentir uma luz emergente, clara que quase cega. É o nosso coração a bater. Devos (de quem o IndieLisboa já tinha exibido a curta metragem We Know) é, claramente, um cineasta a seguir. (Miguel Valverde)
Um olhar retrospectivo para o ano de 1969 permite ver como foi marcante na história mundial. Pela primeira vez um ser humano pisou a lua, aconteceu o festival de Woodstock e foi o ano em que se considera que nasceu a internet. O dia 6 de Dezembro do mesmo ano fica marcado por um outro acontecimento, o festival de Altamont no final da digressão americana dos The Rolling Stones, que reuniu cerca de 300 mil pessoas. Diz-se que aqui morreu o sonho dos anos 60. Neste festival tocaram também Santana, Jefferson Airplane, The Flying Burrito Brothers e os Crosby, Stills, Nash & Young. Este era o Woodstock do oeste. Há vários mitos sobre o que aconteceu. Os Stones contrataram os Hell’s Angels para fazer a segurança do festival. Mas as coisas precipitaram-se e a violência tomou o lugar da paz e do amor, culminando na morte por esfaqueamento de Meredith Hunter, momento captado pelas câmaras do documentário e que depois foram usadas como prova. Gimme Shelter é o filme desses acontecimentos, por muitos considerado o melhor filme de rock de todos os tempos, exibido aqui no âmbito da comemoração do seu 50º aniversário. (Carlos Ramos)
God’s Nightmares apropria-se de imagens de outros filmes para pensar no que seriam os pesadelos de Deus. Um filme de montagem alucinadamente cómico que procura o sentido neste monólogo interior divino, onde o maior medo é ser só mais um homem. (Duarte Coimbra)
Esta comédia de enganos começa com a morte de Guelwaar (que significa “o nobre”), padre e ativista católico. Quando a família vem reclamar o corpo à morgue apercebe-se que este desapareceu e que foi enterrado por engano num cemitério muçulmano. Sátira a uma África atolada pelos pequenos conflitos, por uma burocracia paralisante e pelos dogmas e crenças religiosas em confronto. A ironia fina e os pequenos detalhes revelam toda a mestria de Sembène.
Uma mala, um poema, personagens que transitam em acasos, e projecções, num jogo de espelhos e coincidências (a mala é responsável). Os fantasmas acordam e a narrativa compõe-se, fragmenta-se, destrutura-se, enquanto sinais duma maldição emergem e multiplicam-se neste drama negro. O contágio está na criação, está na maré do ‘‘vento’’ que açoita os planos, pelo olhar sedutor de Jenkin que talha e retalha esta inquietante e cortante narrativa, black and white. (Carlota Gonçalves)