Quem somos nós? Que espaço há, para cada pessoa, nessa palavra? O RER B atravessa Paris até aos seus subúrbios. Esta é a linha onde Alice Diop traça retratos isolados que compõem um todo. Um filme-ensaio que questiona uma nação francesa assombrada por divisões e fracturas cuja cura parece complicada. Mas há espaço para os gestos que unem os seres humanos, independentemente do que os separa.
Nous abre com uma cena em que um caçador observa um veado ao longe. Ele precisa dos seus binóculos porque, na prática, não se consegue distinguir nada. Um grupo de homens brancos, que parecem vindos de outra época, continuam a vasculhar e a caçar tudo o que está à sua volta. Diop não precisa de binóculos para ver esta extremidade do mundo. A realizadora filma o RER à pinha, cheio de trabalhadores racializados que se levantam muito cedo pela manhã. Conhece um homem que conserta automóveis estragados, e faz uma chamada para o Mali, onde não vai há mais de 20 anos. Segue o percurso de uma enfermeira ao domicílio que administra cuidados primários enquanto conta as suas histórias. Nous fala-nos disto. Sobretudo num tempo em que a organização em comunidade é vista como ameaçadora da República e da lei, e em que o “separatismo” ameaça o “Nós” que o filme pretende afirmar. Alice Diop faz um filme sobre os subúrbios? Filmando-os, a cineasta filma também o fundamento da sociedade. Uma história que não é a narrativa dominante, com um olhar cheio de empatia, que não olha para os moradores das periferias como uma população curiosa em terra desconhecida. Diop diz, a propósito deste nós: “é uma questão e uma dúvida, uma afirmação e um trabalho em construção”. (Mickäel Gaspar)
Alice Diop nasceu em Aulnay-sous-Bois, França. Os seus filmes, que questionam a sociedade francesa e a sua diversidade cultural, já foram exibidos em festivais como o Cinéma du Réel em Paris, BFI Londres, Karlovy Vary, a Viennale e o festival de cinema documental em Lussas, França. A sua longa-metragem documental La Permanence obteve o grande prémio no Cinéma du Réel e Vers la Tendresse recebeu o César para melhor curta-metragem em 2017.