A Mordida

Num laboratório modificam-se geneticamente os mosquitos macho para transmitir um gene letal às fêmeas. Um homem, uma mulher e uma mulher transgénero vivem uma relação poliamorosa. Contra a epidemia reacionária, a autonomia de intimidade e da reprodução.

Em tempos de epidemia cuja propagação se dá através de mosquitos, há laboratórios a modificar geneticamente estes insectos para esterilizar a sua propagação. Ao fundo surgem relatos de cidades ocupadas por militares que numa demonstração de força abrem guerra ao inimigo. Enquanto isso o amor persiste e reproduz-se em lógicas que parecem contrariar o pensamento binário aplicado à natureza. Num cenário de quase ficção científica, atravessamos um universo irreal onde a música funciona se junta às personagens na construção do drama. (Margarida Moz)

 

The Booksellers

Nos anos cinquenta existiam quase quatro centenas de livrarias em Nova Iorque. Hoje subsistem menos de cem. D.W. Young retrata o negócio de livros raros na cidade, num momento de viragem. Das lojas antigas e seus clichés – homens de tweed, ávidos leitores entre pilhas de livros -, e as lojas mais modernas, com livreiros jovens, cheios de ideias que pressupõem uma interacção mais presente com a comunidade.

 

A Selva de Betão

Às vezes parece que nada de muito interessante acontece na nossa casa, mas, quando menos esperamos, a aventura começa.

Spalovač mrtvol

Poucos filmes mostram tão bem a mentalidade e a paranóia social que desembocou no nazismo, como esta obra prima de Juraj Herz, que após a sua estreia esteve banida duas décadas na Checoslováquia. No final dos anos 30, acompanhamos a vida de Mr Kopfrkingl, homem feliz, casado, duas filhas e que trabalha num crematório em Praga. Mas a presença da morte e o gérmen da discriminação vão contaminando o seu quotidiano. Apresentado em cópia digital restaurada.

 

The Fall

Nesta curta comissariada pela BBC Films, Jonathan Glazer (Under the Skin) filma uma multidão de mascarados que persegue e pune um homem de máscara. Crítica social, inspirada pelo quadro de Goya, El sueño de la razón produce monstruos.

 

A Febre

O filme que arrecadou em 2019 o prémio da crítica no Festival de Locarno é um drama acerca das pressões de um modo de vida urbano e moderno. No centro da primeira ficção da realizadora brasileira Maya Da-Rin está Justino (Regis Myrupu), um homem de meia idade, viúvo, de origem indígena que trabalha no porto de Manaus. Quando a sua filha o informa que quer ir estudar enfermagem para a cidade de Brasília, este vê-se acometido de uma estranha febre…

Justino é um indígena Desana de 45 anos que trabalha como vigia no porto de cargas de Manaus, uma cidade industrial cercada pela floresta da Amazónia. Desde o falecimento da sua mulher que a sua filha é a sua principal companhia. Ainda assim, Vanessa, que trabalha como enfermeira, é aceite para estudar medicina em Brasília, longe de Justino. Aquando desta notícia e confrontado com a opressão da cidade, Justino entra num estado lânguido e febril e começa suspeitar que uma criatura misteriosa segue os seus passos. A origem enigmática da sua condição e a aproximação misteriosa da floresta, faz crescer uma atmosfera onírica que contagia o espectador com a mesma sensação febril. Justino conta a história de um homem cuja profunda conexão com o mundo natural o faz desconfiar dos instintos predatórios dos humanos. Nesse sentido, A Febre inscreve-se como uma fantasia, ou uma história fantasmagórica. Este resultado sente-se sobretudo no híbrido construído por um trabalho de ficção cruzado com personagens não-actores, o que desafia a percepção do espectador sobre o realismo mágico do filme. (Inês Lima Torres)

 

Espectáculo no Jardim de Infância

No teatro o professor mocho prepara os seus alunos para o espectáculo do final do ano. Infelizmente para ele, muitas coisas inesperadas vão acontecer antes de subir a cortina e o show não será bem o esperado.

 

O Cordeiro de Deus

Após a estreia de Onde o Verão Vai: episódios da juventude (Festival de Berlim, 2018) David Pinheiro Vicente continua a dar-nos um cinema sensorial, do toque e do olhar. Produzido por Gabriel Abrantes, esta é a Páscoa do crescimento, do desejo e da carne.

Diogo vive entre crianças angelicais e adultos falhados. O desejo fá-lo crescer, apesar das delícias da infância lhe cantarem, ainda, inocentes loas. Também David (Pinheiro Vicente) filma entre a delicadeza e a sujeira, ou seja, entre um onirismo sensorial e o cheiro do sangue. Tudo se mistura, elíptica e metaforicamente, num bordado encardido por fragmentos daquilo que talvez sejam sonhos, memórias ou visões (à imagem da teia de apetites que liga as personagens adultas). No centro, de tudo, uma tensão de morte e de culpa (que acabam por se complementar em ritual sacrificial). (Ricardo Vieira Lisboa)

Norteños

Barry é capaz de ter morto a sua avozinha à martelada. Agora precisa de uma ajudinha da sua ex-namorada. O amor vê-se nas pequenas coisas.

 

Notes on the White Plastic Chair: The Movie

Em quase todas as esplanadas de Verão podemos ver, à volta da mesa ou empilhadas, aquelas cadeiras plásticas brancas muito leves. Este é um filme-ensaio, assinado por um coletivo de arquitetos mexicanos, sobre a famosa cadeira monobloco.

Um filme ensaio sobre cadeiras de plástico brancas. Roubamos para esta sinopse as evidências do próprio filme: podemos confiar cegamente num restaurante com cadeiras de plástico brancas. É um sinal da impossibilidade de o peixe não ser fresco, uma indicação de total confiança no próprio alimento. O plástico causa e causou grandes danos à natureza, mas nunca por meio da cadeira de plástico branca, pois todas as cadeiras de plástico brancas já produzidas ainda estão em uso. Se quisermos encontrar óptimas imagens de cadeiras de plástico, não convém pesquisar no google “cadeira de plástico branca”, mas qualquer outra coisa que nos vier à cabeça, assim encontraremos imagens perfeitas de cadeiras de plástico brancas. Provavelmente um dos filmes mais divertidos do IndieLisboa. (Carlos Ramos)

 

O fim do mundo

Sete anos depois de Até Ver a Luz, Basil da Cunha regressa à Reboleira para contar esta história de regressos, de fins, um retrato de uma juventude e de um espaço social. Spira, 18 anos, está de volta ao bairro após anos num centro de detenção juvenil. Os amigos continuam lá, assim como as festas ou os esquemas para ganhar a vida. As retroescavadoras destroem as casas do bairro, Iara entretanto tornou-se uma mulher e o tráfico é sonho e pesadelo.

Quando Spira regressa à Reboleira, oito anos passados da sua detenção, está no que resta da Reboleira de onde partiu, mas não tem a certeza do que resta de quem era há oito anos naquele mesmo local. É nesta dualidade que irá permanentemente testar os outros e ser posto à prova, especialmente por Kikas e a sua auto-proclamada autoridade como líder dos negócios obscuros e supremo defensor do bairro e das pessoas. Se a cidade – e o país – já tratam Spira como um estranho, onde poderá ele encontrar um eco de pertença? A resposta estará talvez nos momentos em que investe nas demonstrações de interesse por Iara. Uma narrativa que vive do desempenho dos actores não-profissionais, que dão volume à elegia que Basil da Cunha parece querer fazer a um espaço e tempo que (não tão) lentamente desaparecem do mapa urbano. Ficção impura que obriga a pensar na realidade dos não-lugares que povoam as cidades, vítimas das políticas que adoecem a sua poesia e os transformam nesta noite escura. (Mafalda Melo)

 

Os Conselhos Que Vos Deixo – 1

O aparecimento de Bruno Aleixo, o ursinho rezingão com cara de mau (juntamente com os seus amigos, Busto, Renato ou o Homem do Bussaco), no panorama do humor português, não deixou pedra sobre pedra. A sua primeira aparição foi nesta série de curtos vídeos publicados na internet em que Bruno, numa alusão a António Aleixo, Este Livro Que Vos Deixo, dá conselhos sobre xixi, drogados ou roupa de dormir.

 

Os Conselhos Que Vos Deixo – 3

O aparecimento de Bruno Aleixo, o ursinho rezingão com cara de mau (juntamente com os seus amigos, Busto, Renato ou o Homem do Bussaco), no panorama do humor português, não deixou pedra sobre pedra. A sua primeira aparição foi nesta série de curtos vídeos publicados na internet em que Bruno, numa alusão a António Aleixo, Este Livro Que Vos Deixo, dá conselhos sobre xixi, drogados ou roupa de dormir.

 

Os Conselhos Que Vos Deixo – 4

O aparecimento de Bruno Aleixo, o ursinho rezingão com cara de mau (juntamente com os seus amigos, Busto, Renato ou o Homem do Bussaco), no panorama do humor português, não deixou pedra sobre pedra. A sua primeira aparição foi nesta série de curtos vídeos publicados na internet em que Bruno, numa alusão a António Aleixo, Este Livro Que Vos Deixo, dá conselhos sobre xixi, drogados ou roupa de dormir.

 

Os Últimos Românticos do Mundo

Estamos em 2050. O mundo vai acabar dentro de poucas horas numa espécie de nuvem rosa de algodão doce. A palavra de ordem é: amem-se. Pois quem pegou pegou e lá no céu ninguém trepa não.

Uma nuvem rosa aproxima-se e vai ser o fim do mundo! Afinal parece que o vírus foi lançado antes do tempo. Esta fábula queer futurista, vivida em dois tempos narrativos com contornos pouco definidos, permite-nos ir descobrindo uma belíssima história de amor, que poderia ter sido vivida por Thelma e Louise. A estética rosa está vertida nos cenários, no guarda-roupa e nos filtros espampanantes, e alude a muitas referências de videoclip ou jogos dos anos 80. Descoberto no último Festival de Tiradentes, a aventura épica de Arruda, qual vírus bom, arrisca-se a contaminar muita gente. (Miguel Valverde)

 

Other, Like Me

Em 1970, na cidade de Hull em Inglaterra, nasceu um colectivo artístico que iria desafiar o mundo da arte. COUM Transmissions, liderado pelos artistas Genesis P-Orridge and Cosey Fanni Tutti, trabalhavam na área da performance, desafiando os limites impostos aos temas do sexo, pornografia e violência. Quando se viraram para a música criaram a banda Throbbing Gristle, precursora da electrónica industrial. Este é um documentário sobre o seu trabalho.

No ano em que o mundo viu desaparecer, com 70 anos, Genesis P-Orridge, fundador dos pioneiros COUM Transmissions e Throbbing Gristle, que se assumia como um ser “pandrógino” na sequência de uma peculiar intervenção cirúrgica de fusão corporal com a sua mulher, este filme conta, pela primeira vez, a história destas bandas através das palavras do próprios elementos. Um grupo de artistas e músicos que trabalharam em diversas vertentes ao longo de muitos anos e que estiveram na génese da música industrial, na Inglaterra da década de 70. A principal ideia era fundir a arte com a vida e defender a libertação pessoal completa – a qualquer custo. Adoptaram novas identidades, levaram a arte ao limite, inventaram um novo género musical, confrontando tabus sobre o sexo, a moralidade e o lado sombrio do ser humano. Toda uma postura e acções que causaram indignação e escândalos na imprensa e na opinião pública e a acusação por parte de políticos de serem “os destruidores da civilização”. Um filme sobre um marco indiscutível na génese da música industrial e nas artes em geral. (Helena César)

 

Ouvertures

Em 2017, o realizador Louis Henderson e o produtor Olivier Marboeuf foram ao Haiti onde trabalharam com um grupo de artistas do país na tradução para crioulo haitiano e representação de uma peça. Tratava-se de “Monsieur Toussaint” de Édouard Glissant, que acompanha os últimos dias do herói da independência haitiana, Toussaint Louverture. Desse trabalho e de momentos de improvisação nasce o filme, obra colectiva de ressurreição e redenção histórica.

Toussaint Louverture foi o grande líder da revolução haitiana que levou à independência do país que ocorreu já após a sua morte, tornando-se a primeira República negra independente das Américas. Que Haiti existe hoje na promessa dessa revolução? Como sentem os jovens do país a responsabilidade da descendência do herói haitiano? Num filme colectivo, polifónico, habitado pela alucinação e pela promessa de futuro, o grupo de teatro The Living and the Dead Ensemble traduz para crioulo haitiano e encena a peça “Monsieur Toussaint” de Édouard Glissant. São os últimos dias de Louverture, encerrado na sua cela na Cordilheira do Jura, nos Alpes, assombrado pelos fantasmas do passado revolucionário. Mas a figura literária e cultural haitiana por excelência é a espiral e, por isso, o filme escreve-se e brota de todos os lados. E são também as personagens do panteão histórico haitiano que vêm assombrar os actores que trabalham e vivem a peça em Port-au-Prince. (Carlos Natálio)